Jardim das Oliveiras
Ciclo do Natal
4a. Mensagem
Porque um
menino nos nasceu, um filho se nos deu; o governo está sobre os seus ombros; e
o seu nome será: Maravilhoso
Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz; para que se
aumente o seu governo, e venha paz sem fim ...
Isaías 9, 6-7
Federico Barucci, 1590
Estávamos
albergados na bucólica varanda, entre plantas e passarinhos, bem no início de
uma tarde ensolarada, clima ameno, montanhas ao longo, conversa mansa,
arrastada, típica dos nativos das alterosas. Entre nós, sobre a mesa, crocantes
torresminhos, sucos, cervejinha e até uma douradinha e sedosa pinga do norte de
Minas. Os hilários papos-furados corriam soltos, enquanto esperávamos a
preguiçosa lenha queimar devagarinho sob panelas de barro que aconchegavam a
especialidade mineira, tesouro de todos os tempos, ponto culminante do nosso encontro,
o insuperável frango com ora-pro-nobis e angu.
De
repente, um dos comensais disparou: “Em
verdade, em verdade eu digo, todo certinho não entra no reino dos céus”, e
deu um baita tapa na mesa, elevando alguns milímetros os utensílios.
Gargalhada geral. Cada um tomou sua dose de bebida. O abusadinho virou a
pinga, os torresmos acabaram. Pedimos ao garçon calabresa apimentada com cebola
e pimenta biquinho. Os ânimos foram dando lugar ao silêncio. Alguém emendou: “Que teologia de botequim é essa, sô ?”
Aquele
cabra metralhou-nos. Com a simplicidade característica dos que contemplam
montanhas, decodificou sua afirmação.
“Os certinhos são
aqueles que sabem tudo. Gostam de acusar, ver defeitos nos outros, corrigir
gregos e troianos. Apresentam-se em público, ridiculamente, com a máscara da
impecabilidade. São mestres nos versículos e procuram o pódio. Quem não os
conhece por dentro, rendem-se por admirá-los.”
Então,
em meio ao silêncio dos compadres, ele enfatizou: “Não precisam da Graça de Deus; pecaminosamente, constroem a ilusão da
sua própria ideia de graça. Não
precisam das misericórdias do Pai Amado, porque os outros é que erram. Discorrendo a doutrina, são réus confessos; a
sisudez explícita da face, a vara verborrágica pronta para ser usada por todos
os lados, a impossibilidade de amar sem nada em troca, tudo isso, denuncia a
verdadeira raíz. Querem ser deuses, na verdade.”
Olhando
nos nossos olhos, numa ousadia que eu nunca vira nele, encetou: “Jesus não disse que viera para os doentes,
os perdidos ? Paulo, em meio a lutas e súplicas, não recebeu do Senhor o pedido
de dependência dEle (A minha Graça de basta”) ? A palavra forte do evangelho
não é arrependimento ?”
Nós,
os famintos, pensávamos. De quem ele estaria falando ?
Estávamos
no mês de dezembro, mês de Advento, talvez mês inspirador para o nosso
intérprete Bíblico. E ele destrancou o segredo da sua afirmação: “Estava lendo o profeta Isaías, quando
deparei-me com um dos nomes do Senhor Jesus: Maravilhoso Conselheiro. Uai, sô,
somente encharcado de humildade podemos reconhecer a necessidade de Conselheiro.
Somente o Conselho Divino pode restaurar-nos e orientar-nos, afinal, a carne é
fraca, o coração do homem é corrupto, e até o apóstolo entendeu que, quando ele
era fraco, reconheceria a dependência e conselho de Deus, tornando-se forte,
justamente dos conselhos e bênçãos emanadas do Pai. Jesus veio para isso
(Advento) e somos os imerecidos agraciados pela bondade incansável dEle.”
E
logo, indo direto ao ponto, entregou-nos a apoteose: “Quem não examina a si mesmo, diante do Deus Santo e Irrepreensível, não
tem fome da Graça que desce do céu.”
“Uau!”,
sussurrou um. “Grande!, disse outro. “Verdade!”, disse o que bebia suco.
Coincidentemente
ou não, os garçons chegaram com as panelas, o perfume dos condimentos
preencheram o lugar.
Não
tenho dúvida até hoje, aquele foi um almoço santificado, cheio da graça do
Senhor, porque nós, pecadores confessos, degustamos dois banquetes: O
Maravilhoso Conselheiro nasceu por e para nós, perdidinhos; e o frango, ai o
frango...