17/02/2006

Almas Vazias em Brokeback Mountain


“Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados” (Ef 2,1)

Para qualquer questão da vida, formulamos juízos de acordo com os valores e crenças que dão suporte à nossa visão de mundo (cosmovisão). O demonstrativo cotidiano do mundo ocidental evidencia um total esvaziamento dos valores tão caros à nossa formação. As mudanças rápidas, as avalanches de novas idéias e a pulverização do que críamos, tornam o mundo em que vivemos um terreno fértil para “o que não sabemos em que vai dar.”
Está em curso, desde o início da 2ª metade do século passado, um movimento cultural que solapa nossas caras heranças judaico-cristãs, incutindo de gota em gota, usando todos os recursos de comunicação disponíveis, a crença na pluralidade, no multiculturalismo, no politicamente correto, no acolhimento de qualquer tendência sem a aplicação de critérios. O resultado é que junto com a água do banho, o nenê vai junto para a lama. Vamos acordar ?
Há um filme em cartaz, O Segredo de Brokeback Mountain, (provável ganhador de oscars, não duvide) que é celebrado pela história de “amor” homosexual entre dois caubóis americanos, nos idos dos 60.
Fui ver o filme. Está embutido o movimento (inteligentíssimo) internacional organizado, que atua em todas as frentes, para exportar a causa “natural” do homosexualismo (o mesmo para o filme Tudo Em Família). Tenho o direito inalienável de não ser preconceituoso, e sim conceituoso, e por isso não achar natural, baseado no meu fundamento de vida: a Palavra de Deus (I Co 6,9-10; I Tm 1,10 etc).
Mas na montanha Brokeback eu vi outra coisa. Vi a metáfora do vazio humano, da falência de uma sociedade ocidental que começou cristã e tinha os olhos bem abertos e alegres nos seus valores.
Jack Twist e Ennio Del Mar, dois caubóis destruídos espiritual e emocionalmente, foram contratados para pastorear ovelhas nas montanhas do Wyoming, EUA. Fracassaram profissionalmente, fracassaram existencialmente. Foram sugados pela solidão nas montanhas, palco para a inevitável exposição das vísceras emocionais.
Ali, no vazio do dia, e nas insuportáveis noites, conviviam com o lixo: de suas infâncias, de suas comidas, de seus futuros, e do incômodo daquilo que nem eles sabiam. Eram iguais e solidários no deserto de suas vidas. Juntaram os cacos, porque já não suportavam a própria imagem em qualquer espelho d´água. O ponto revelador do “saara espiritual” revelou-se na total ignorância do significado do Pentecoste cristão. A tradição metodista dos familiares para nada serviu. A falta da religião cava um fosso profundo para o nada.
Não conseguiram ser pastores de ovelhas (elas berravam desprotegidas e eram comidas pelas feras); ao contrário, igualaram-se a elas, e mesmo sem o saber, ansiavam pelos pastores de suas almas.
Não importa se na deslumbrante montanha, se no cabaré mexicano (por onde passou um deles) ou se na sala de estar de uma família ordinária, quando a alma está vazia, está propensa a buscas desesperadas por significado, por alimento que nutra a condição insuportável. Então, agarra-se ao que se encontra. E, para desgraça, pode ser a bebida, a mentira, o auto-engano, a violência que destrói cônjuges inocentes ou o equivoco de um “amor” que não era para ser. Um caubói acabou morto a pauladas. O outro acabou, provavelmente, afogado na bebida, sugado pela angústia, negando os apelos da família para ir à Igreja.
No conto que originou o filme, de Annie Proulx, o caubói diz que eles “teriam que agüentar o que não podiam consertar”. Ledo engano, e aqui entra a leitura cristã: nada é impossível para Deus. A condição de nascer de novo (espiritualmente) é o verdadeiro encontro para o qual todos nós nascemos: glória de Deus e satisfação pessoal.
Devemos assistir O Segredo de Brokeback Mountain ? Sim, para acrescentar ao seu entendimento que o vazio que habita o coração humano não escolhe paisagem, está presente na paradisíaca montanha ou na miséria de algum barraco. O mundo pode não suportar tal entendimento, tal enfrentamento, mas o vazio só terminará quando JESUS subir a montanha Brokeback, indo ao encontro das ovelhas sem pastor.

2 comentários:

Anônimo disse...

Caro Pastor,

Enfim algo em que vale a pena usar o nosso precioso tempo.
Parabéns pelo seu blog!
Agradeço pelas mensagens tão edificantes, pelo cuidado que demonstra por suas ovelhas e a visão de vida que procura nos transmitir em todas ocasiões.

Anônimo disse...

Prezado Reverendo Mauro,

Parabéns por sua iniciativa em criar este espaço facilitador da comunicação.

Primeiramente, gostaria de lhe atentar para o fato de que, quando sua crítica relativa à uma obra cinematográfica ou literária conter informações reveladoras sobre a história, favor notificar com antecedência o leitor no intuito de preveni-lo que a continuidade da leitura pode vir a estragar surpresas que o espectador teria ao se deparar com a obra.

Usualmente utiliza-se o termo “spoiler” oriundo do inglês para indicar textos que contém informações reveladoras. Exemplo: “contém spoilers”.

Aproveito para avisar que o texto abaixo de minha autoria contém spoilers sobre o filme “Brokeback Mountain”.

Quanto a sua crítica sobre o filme supracitado, devemos tomar cuidado para não temer excessivamente o terreno fértil para “o que não sabemos em que vai dar” e acabar criando juízos ou conceitos com base somente no medo de se perder aquilo com o que estamos acostumados.

Acredito que o modo como encaramos o mundo deva ser constantemente revisto, faz parte do aperfeiçoamento pessoal e da evolução espiritual. Não é nada confortável rever valores, porém, é recompensador.

Se dentro do “movimento cultural que solapa nossas caras heranças judaico-cristãs” o senhor esteja incluindo o homossexualismo, devo corrigi-lo que não se trata se um “movimento” surgido na metade do século passado. Homossexuais existem desde a época dos antepassados da humanidade. Muito antes de Cristo, pessoas de mesmo sexo possuíam relações afetivas, às vezes baseadas erroneamente no prazer carnal, às vezes baseadas em sentimentos verdadeiros. Até mesmo animais na natureza possuem ocasionalmente relações homossexuais, estas sim, quase exclusivamente baseadas no instinto, na química, no desejo carnal animal. Digo “quase”, pois nunca se sabe se um animal mamífero superior, como um gorila, um chimpanzé ou um orangotango, não pode desenvolver laços afetivos verdadeiros com outro ser do mesmo sexo e de sua própria espécie.

Concordo que junto da água de banho venha muita lama. Talvez seja por isso que devamos ser extremamente cuidadosos na hora de diferenciar o que é água do que é lama.

Não concordo com as aspas colocadas na palavra amor. Por acaso o senhor acha impossível haver amor e paixão verdadeira entre pessoas do mesmo sexo?

Sou contra a promiscuidade e relacionamentos livres de sentimentos verdadeiros, não importa que ocorram entre pessoas heterossexuais ou homossexuais. Também sou contra as pessoas não abraçarem sua natureza e não lutarem por seus sonhos e crenças.

Acredito que amor e paixão verdadeira possa ocorrer entre pessoas do mesmo sexo. O que há de anti-natural nisto? Anti-natural é negar sentimentos fortes e verdadeiros.

Simplesmente por pessoas de mesmo sexo não reproduzirem condena-se o relacionamento destes? E casais ditos “normais” que possuem problemas de fertilidade? Também são anti-naturais?

A homossexualidade, assim como outras características humanas, comprovadamente tem a ver com a genética do indivíduo e com o ambiente de criação, e isto não quer dizer que seja uma “doença” genética ou psicológica.

Gostaria de saber exatamente quando que “a sociedade ocidental que começou cristã” tinha os olhos bem abertos e alegres nos seus valores. Não acredito que tal sociedade cristã de olhos abertos e alegres no seus valores tenha existido. Não passa de uma fantasia utópica para se contrapor aos comportamentos que são condenados pelas religiões (alguns muito bem condenados, outros condenados de forma totalmente dogmática e esteriotipada).

Concordo que os valores sociais estão em falência, que as pessoas estão cada vez mais vazias e superficiais e que, em geral, a situação não é nada boa, porém, no passado não foi muito diferente.

A principal diferença que temos hoje é o número de pessoas sobre o Planeta e a evolução tecnológica, que age como ferramenta potencializadora da capacidade do homem de priorizar valores distorcidos, como o materialismo, o consumismo, o egotismo, o culto à imagem, ao poder, ao dinheiro, etc.

Não saber o significado da palavra Pentecostes não implica em não saber no que seu significado infere no dia a dia. Um índio que nunca tomou conhecimento de Cristo pode ser o melhor exemplo de cristão devido ao seu comportamento natural. Recomendo o filme “A Missão” que, infelizmente, continua extremamente atual: muitos são os que desejam “salvar” aqueles que já estão salvos ou no próprio caminho da salvação.

O que levou Jack Twist e Ennis Del Mar a terem uma vida infeliz não foi a falta de religião ou Igreja e sim não terem seguido sua vocação natural, não terem priorizado o sentimento verdadeiro que sentiam e terem insistido em fazer parte de uma vida “tradicional” que não era natural para eles.

Ambos poderiam ser recriminados por fumarem, beberem, por até mesmo caçarem um alce sem real necessidade de sobrevivência (um alce daquele tamanho poderia alimentar uma família inteira e, para apenas dois homens, com toda certeza implicou em desperdício), assim como por insistirem em casamentos onde não havia afetividade verdadeira, onde não havia amor.

O desejo sexual instintivo de Jack Twist também é condenável. Este possuía um instinto sexual animal para outros homens (muitos cometem o mesmo erro de igual proporções em relação à mulheres), o que fica claro em sua viagem ao México e no caso que teve com outro homem, mesmo amando Ennis. Infelizmente, Jack simplesmente não aguentava ficar tanto tempo longe de Ennis e refrear seu desejo sexual (assim como muitos maridos que acabam traindo a esposa quando estão a longa distância e, diga-se de passagem, muitos não necessitam nem mesmo da distância como incentivo à traição).

Ennis por sua vez, poderia ser recriminado por não querer usar proteção quando tinha relações sexuais com sua esposa, mesmo frente as dificuldades financeiras que estava sofrendo ao criar duas filhas e, principalmente, por não amar verdadeiramente sua esposa.

Mas acredito que não temos o direito de recriminá-los por se amarem, por gostarem da companhia um do outro e por desejarem dar prazer um ao outro.

O cowboy morto a pauladas não teve este fim devido ao fato de ser homossexual ou por não ter comparecido em cerimônias religiosas durante sua vida e sim por outras pessoas não compreenderem sua condição. Quem matou Jack Twist foi o preconceito (ou conceito se preferir) e não a falta de religião e Igreja.

O que acabou com Ennis Del Mar não foi “não ter ouvido o apelo de sua família para participar da Igreja Metodista” e sim não ter ouvido o apelo de seu coração, não ter sido corajoso o suficiente para enfrentar uma sociedade ignorante (a qual comete ações que ele com 9 anos de idade teve oportunidade de vislumbrar pessoalmente quando seu pai fez questão de lhe mostrar a penalidade sofrida por um homossexual da vizinhança).

O que acabou com Ennis Del Mar foi justamente não ter respondido à sua natureza. O que restou desta foi apenas um cartão postal de Brokeback Mountain pregado na porta do armário e um casaco pendurado no cabide guardado com carinho pela pessoa amada.

O sentimento que rasgava-o por dentro foi a sensação de perda de uma realidade alternativa onde os dois estenderiam os momentos agradáveis que usufruíram em Brokeback Mountain em uma vida juntos. Claro que esta vida a dois não seria um mar de rosas todo o tempo graças justamente à incompreensão da sociedade e aos problemas comuns do cotidiano, não presentes nos acampamentos na montanha. Provavelmente terminaria em uma tragédia similar ao fim de Jack Twist ou do vizinho que teve seu pênis arrancado antes de ser morto por pessoas preconceituosas da redondeza.

Seres humanos não são ovelhas, ou pelo menos, não deveriam ser. Um líder de verdade não guia as pessoas a lugar algum, torna-as guias de sí mesmas. Ensina-as a raciocinarem e sentirem por sí próprias.

Não tenho nenhum motivo especial para defender homossexuais, a não ser pelo motivo óbvio de também serem seres humanos. Acho, inclusive, que muitos homossexuais, assim como heterossexuais, são protagonistas de comportamentos recrimináveis relacionados à futilidade, superficialidade, imersão na ilusão, egocentrismo, etc.

Não faço parte do grupo de homossexuais e infelizmente não tenho muitos amigos que o façam (não porque eu gostaria que os amigos que possuo fossem gays mais sim porque eu não veria problema algum em ter amigos homossexuais, pelo contrário, imagino que seria enriquecedor).

Amo muito uma garota extremamente especial, mas caso amasse um homem, não seria tolo o suficiente a ponto de negar meus sentimentos verdadeiros e viver de maneira incompleta, de maneira infeliz, apenas porque religiões me condenariam ao inferno e a sociedade me rejeitaria.

A obra prima em quadrinhos de Alan Moore, “V de Vingança”, recentemente adaptada ao cinema, mostra um futuro apocalíptico onde negros, homossexuais e outras minorias foram trancadas em campos de concentração na Inglaterra de maneira análoga ao realizado com os judeus na Alemanha nazista.

Medo, incompreensão e exclusão frente a diferenças levam a este tipo de resultado: dor, sofrimento e injustiças.