O povo que caminhava em trevas viu uma
grande luz; sobre os que viviam na terra da sombra da morte raiou uma luz.
Porque um menino nos nasceu, um filho nos
foi dado, e o governo está sobre os seus ombros. E ele será chamado Maravilhoso
Conselheiro, Deus Poderoso, Pai Eterno, Príncipe da Paz.
Is 9, 2.6
Is 9, 2.6
Disseram-me
que ele estava entre nós.
Intrigado
com um trecho do profeta Isaías, quando lido no tablet de alguém ao meu lado no
metrô, confesso, sem entender o motivo, razão outro raio qualquer, que a
passagem ficou martelando na minha mente. Era uma manhã de domingo. Não mais um
domingo qualquer.
Vagarosamente,
comecei a recordar sobre o texto lido de soslaio. Sim, lá nos idos da infância,
minha avó lia essas e outras nas noites de Natal. Lembro-me, agora, com todas
as cores e sons, sobre o que, ano após ano, impressionava-me: Um menino nos nasceu ... um filho nos foi
dado ...
Pois é,
nessas bifurcações da vida, acabei tomando outra estrada: solitária, destituída
dos símbolos familiares, das esperanças renovadas a cada época natalina, entre
alegrias, comes e bebes. Lembro-me de
que o centro das atenções sempre era um Menino pobre, simples, mas incensado e
cantado em prosa e verso, que catalizava as emoções e razões das gentes.
Lembro-me de que a atmosfera do período impregnava a casa, bairro e cidade.
Sei não,
talvez o motivo pelo qual eu tomei a estrada árida da vida seja por influência
indireta e passiva dos meus pais: executivo de multinacional e professora
universitária, ambos com dezenas de títulos. Lembro-me de que quando já
adolescente nossa família apenas tangenciava as datas importantes da tradição,
trocando gentilezas e felicitações protocolares. Nunca mais reuni com todos os familiares. O
Menino foi perdido ou banido das nossas conversas, imaginário e ritos.
Que
coisa ! Agora, sem saber a razão,
encheu-me o espírito e mente de curiosidade ou necessidade de ... procurar o
Menino: olhos atentos, ouvidos aguçados e pernas pra que te quero, ou seja,
subterraneamente, estava desesperadamente fugindo do meu vazio. O trecho do
profeta, capturado pelos meus olhos curiosos, discorria sobre um povo em
trevas, que estava abrigado sob sombras de morte. Caiu-me como uma luva.
Fui às
livrarias. Nada ou quase nada. Como assim ? Onde estavam os escritores para nos
recontar a história do Menino ?
Fui à
catedral. Vi rito, cerimônia, faces circunspectas, protocolos e linguagens
cifradas. Vi arte com gosto. Mas e o Menino ? Aquele lá de dentro estava
distante e impessoal.
Fui às
igrejas populares. Vi cantoria
mirabolante, êxtases e salvas para recolher ofertas. Muita autopromoção. Mas e a exaltação do Menino ?
Fui ao
shopping. Vi decoração vermelha e dourada. Vi gente correndo ensacoladas nos dois braços. Perguntei ao bom velhinho, sentado entre
crianças. Ele devolveu-me: Que Menino ?
Qual é o nome dele ? Percebi que o bom e simpático velhinho era de outro
mundo ou apenas um bom artista. O Menino não estava no templo do consumo.
Rodei a
cidade procurando pelos presépios. Onde está a representação artística e
criativa do Menino ? Encontrei rodas de
samba, pagodes e bebedeiras. avistei jogo de damas e carteados nas praças e a
expectativa do feriado. O Menino não estava ali.
Entrei
na papelaria, ávido por encontrar aqueles maravilhosos cartões de época. Para minha desagradável surpresa, de fato, só
encontrei mensagens açucaradas e a repetitiva frase: Boas Festas ! Ok, amo Chester, panetones e rabanadas, mas
... e o Menino ?
Comecei
a aguçar mais os ouvidos, levantar as orelhas, olhar ao redor com radar
afinado. Queria ouvir as linguagens e os desejos. Estatísticamente, de vera, nunca houve tanta
concordância, a frase que não queria calar era: “Paz, amor e saúde para você e família”. E o Menino ?
E a mensagem que o Menino trouxe ao mundo ? Nada ?
Cansei.
Sem entender direito, com a recordação vaga da infância familiar, onde o Menino
estava vivamente presente, fui relaxar no banco da minha praça preferida. Deixando a mente esvaziar, frustrado e sem
entender, quase adormeci. Voltei ao estado de atenção e lucidez quando uma
senhora, calma, doce, elegante, educada, polida, ofereceu-me um folheto-cartão.
Agradeci. Percebi a qualidade e, sincera e instintivamente, talvez em milésimos
de segundos, querendo retribuir a gentileza, convidei-a para sentar ao meu
lado. Minha surpresa: o cartão-folheto
falava, apresentava e discorria sobre o Menino ! Uau ! Bingo ! Tal a minha
alegria.
Perguntei-a
se ela se importaria de me contar sobre a razão do nascimento do Menino.
Ternamente, com ar, voz e expressão de vó querida, matou a charada, saciando
meu coração por duas horas, mas que pareceram poucos minutos. Eis o Menino ! De
verdade. Para minha surpresa, e jamais esquecerei, ela começou lendo:
Seja a
atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus,
que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se;
mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens.
E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até à morte, e morte de cruz!
Por isso Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo nome,
para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, no céu, na terra e debaixo da terra,
e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai.
Filipenses 2:5-11
que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se;
mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens.
E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até à morte, e morte de cruz!
Por isso Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo nome,
para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, no céu, na terra e debaixo da terra,
e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai.
Filipenses 2:5-11
Apresentou-me não só o
nascimento do menino, mas toda a trajetória de vida e mensagem central, com e
pela qual recordamos o seu nascimento.
O Menino
estava tão perto e eu não o via. Por quê ?
Porque deixaram de apresentar o Menino, ano após ano, banindo-o das
catedrais, presépios, canções, mensagens, corações e mentes.
Sem o
maravilhoso nascimento do Menino, mesmo sem pompa e circunstância, não
dissiparíamos as trevas desta porca existência, continuaríamos nas estradas
erradas da vida e jamais experimentaríamos e permaneceríamos no amor
incomensurável do Pai do Menino.
Ainda há
tempo para reverter isso. Viva o dia do
Menino !
Feliz
Natal !