Sou fã do Salmo 116, 12: “Que darei ao Senhor por todos os benefícios para comigo ?” O
salmista, neste versículo, condensa as riquezas oriundas de Deus. Poucas
palavras, e um oceano de atributos divinos distributivos. A pergunta do poeta
embute experiências de percalços passados. Seus olhos fitam o horizonte,
encontram a evidência do Provedor Incondicional, o mesmo que respondera nas
horas mais agudas de aflição (“Elevo os
olhos para os montes: de onde me virá o socorro? O meu socorro vem do Senhor
que fez o céu e a terra.” Sl 121,1-2)
Somente uma pessoa penetrada pela mais absoluta sinceridade,
reconhecedora das misericórdias divinas, ora imanentes, ora transcendentes,
extrai de suas entranhas o verbo que traduz e revela a graça e visitação do Senhor:
Que darei ? Que darei ? Onde encontrarei
objeto, palavra, sentimento, gratidão, gesto que seja oferenda minimamente
compatível com as bênçãos ? O quê ? O quê ?
A questão é: Se
parássemos um pouco, se diminuíssemos o pique, o ritmo, se déssemos chance ao
cruzamento da inteligência com a emoção, se ao menos olhássemos e recordássemos
com cuidado, seríamos revestidos de constrangimento e uma porta se nos abriria
para enxergar a realidade. Descortinaria diante de nossos olhos o quadro
completo: Ele é Deus!, está presente, atuando, cuidando, protegendo, avisando,
aconselhando, exortando, advertindo, abençoando e ... amando, amando, amando
muito.
Gratos são os que vazam da razão para o coração, entendem e
derivam para todo o ser o preenchimento de Deus (“Amar a Deus de todo entendimento, alma e coração”. Mt 22, 37). Somente ali, no centro figurado e
representativo de todo o nosso ser, repousa a usina que nos recarrega
cotidianamente de oferenda, de ações de graça. Somente o coração grato, testemunha
da presença do Senhor, somente aquele que tem algo denso para contar pode doar,
entregar, depositar, desapegar, ofertar, depositar tudo no altar; conforme
rezam os hinos “Eu venho como estou”
e “Tudo deixarei, tudo entregarei”.
Quando o salmista diz: “Que
darei ... ?”, significa que já decidiu, entendeu tudo - que tudo não lhe
pertence. Quem é o dono de tudo ? O
Senhor Deus. Se o Senhor é o dono, não
há apego mesquinho. O salmista estava livre, leve e solto para desejar doar,
oferecer, ofertar, para declarar que era um agraciado, abençoado, que jamais
esteve só.
Esse é o status da pessoa mais livre da face da terra. A que conta, confia, depende e anda com Deus.
Os olhos do salmista alcançam além do horizonte, suas mãos
não precisam agarrar o que quer que seja. Insegurança é palavra banida do
dicionário existencial pessoal, porque o Senhor habita, reina, governa e
sustenta.
E você, o que dará ?